Promoções ilegais de funcionários podem custar mandato a autarcasA Inspecção-Geral da Administração Local (DGAL) decidiu apertar a vigilância aos presidentes de câmara e de juntas de freguesia que promoveram ou tentaram promover os seus funcionários sem terem aplicado integralmente o sistema de avaliação da função pública (SIADAP).
As orientações dadas aos inspectores são claras: os autarcas que atribuíram prémios ou progressões nestas condições podem ser acusados do crime de peculato e perder o mandato.
Os funcionários envolvidos, e que acabaram por ter um aumento dos respectivos vencimentos, também não ficarão impunes e serão obrigados a devolver o dinheiro recebido.
O problema foi detectado durante a inspecção a uma autarquia, o que levou o responsável da DGAL, Orlando Nascimento, a enviar um comunicado a todos os inspectores, alertando que os autarcas que façam progressões gestionárias sem aplicarem o SIADAP correm o risco de perder o mandato por crime de peculato, já que se trata de "um aproveitamento de dinheiros públicos a favor de pessoas que não têm direito a recebê-los".
Numa circular interna, o inspector-geral alerta que o SIADAP "deve ser aplicado em bloco, não sendo admissível aos senhores presidentes das câmaras municipais que dele escolham as normas que lhes aprouver aplicar, esquecendo as restantes". Além disso, acrescenta, essa atribuição não pode escudar-se na "desculpa" de que os trabalhadores não devem ser prejudicados pela inacção do município.
O número de câmaras onde isso aconteceu não é divulgado nem pelo Governo nem pelos sindicatos, mas fonte oficial da secretária de Estado da Administração Local garantiu ao PÚBLICO que surgiram "vários pedidos de esclarecimento, a par da acção inspectiva da IGAL", o que levou a que "alguns presidentes de câmara recuassem no propósito de promoverem a alteração da posição remuneratória de funcionários, por opção gestionária, sem aplicação do regime legal do SIADAP".
Desde 2006, está em vigor um diploma que adapta o SIADAP à realidade autárquica e que foi revisto em Outubro de 2009. Pelo meio, entrou em vigor a Lei dos Vínculos Carreiras e Remunerações, que cria duas vias para os funcionários públicos progredirem na carreira. Uma obrigatória - que ocorre sempre que os funcionários juntarem dez pontos na avaliação - e outra gestionária - que depende das notas obtidas em cada ano, das disponibilidades orçamentais e da decisão dos dirigentes dos serviços (que nas autarquias é o presidente da câmara ou da junta).
Para a IGAL, esta segunda hipótese só pode ser aplicada nas câmaras que avaliaram os funcionários à luz das regras do SIADAP. Caso não tenham aplicado este sistema de avaliação não podem fazê-lo. Nos sindicatos, a interpretação é outra. Para o Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública (Sintap) "o trabalhador não deve ser penalizado e ter que aguentar ainda mais tempo sem poder mudar de posição remuneratória". O dirigente José Abraão lembra que a própria Lei dos Vínculos prevê que quando os trabalhadores não foram avaliados entre 2004 e 2006 recebem um ponto por cada ano para efeitos de progressão na carreira. "Tudo isto é feito à luz das normas legais", justifica.
Mas não é só nas autarquias que a aplicação do SIADAP tem suscitado problemas. Cerca de três mil trabalhadores dos impostos ameaçam processar o director-geral por este ter revogado a contagem de pontos da avaliação de desempenho dos últimos três anos e que lhes permitiria progredir na carreira já este ano.
José Azevedo Pereira fez isto depois de ter recebido indicações da Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público para aplicar quotas na distribuição desses pontos, o que reduz o universo de funcionários com progressão.